06
Ago 10

 

 

As palavras deslocam-se hoje para parte incerta. Partem. Ou fogem. Não sei para onde vão. Limito-me a segui-las. Em boa verdade, para além de estar ciente de que é parte integrante de mim este ímpeto inapelável de seguir as palavras em movimento, em silêncio, poucas coisas sei.

 

Sei que, segundo o relógio, são duas e meia da manhã. Pouco mais sei. Mas continuo a seguir a imprevisível deslocação das palavras. Provavelmente porque gosto do lado oculto e escarpado das ilhas, de seguir os trilhos mais difíceis e improváveis para alcançar os cumes.

 

Resulta daí a minha solidão, suponho. E ela é funda; pois dificilmente alguém conseguirá acompanhar-me pelas escarpas abruptas que se insinuam no meu caminho; carregando palavras e o seu sarro, carregando luzes, sombras, imagens, mares e sedes, perfumes e sabores que me acariciam doce e rudemente os lábios.

 

Sigo as palavras, hoje em deslocação particularmente rápida e errática. Amanhã, dia de outro dia, talvez alguém me bata à porta. E não sei se estarei cá, aqui, carregado de palavras ou totalmente despojado delas. Não sei se a porta será aberta. Sei que depois disso, horas depois, voltarei aqui para dormir de novo. Então sim, por certo, de novo entre palavras.

 

Porém insisto: sei que pouco mais sei do que isto. E se mais soubesse do que isto que interesse teria isto - isto que nem veria de certeza a luz do dia?

 

*

 

E todavia eu sangro. Continuo a sangrar. Eis um sinal de que estou vivo, concluo então. Vivo entre as palavras sanguinolentas que ainda não partiram ou fugiram e que, surpresas, hesitantes, me amparam. E sendo assim, considero-me pronto a partir para qualquer lugar onde as outras palavras, as que partiram, eu possa - quem sabe? -, reencontrar.

 

É isso: as palavras deslocam-se. Limito-me a segui-las, a persegui-las. Tentarei unir umas às outras. Vou partir. Só preciso de um límpido olhar para partir. Pouco mais sei nesta(s) noite(s) em que o vento atravessa o silêncio.

 

(06.08.2010, há 12 horas atrás)

 

publicado por flordocardo às 14:27

E agora digo eu... obrigada por este momento inspirado cheio de palavras enleadas de forma notável. São complicadas as palavras, mas somos nós que as escolhemos. Às vezes basta uma para estragar, outras vezes basta uma para iluminar. Há que saber escolher e dizê-las, mas nunca deixar de as dizer.
Beijokas. Adorei.
ónix a 7 de Agosto de 2010 às 19:33

«Nunca deixar de as dizer», concordo. Mas por vezes dói muito. Concordas?
Mas ainda bem que gostaste!
Bjões! * * *
flordocardo a 7 de Agosto de 2010 às 23:46

Mais vale doer do que ficarem sem ser ditas. Eu acho.
Bom fim de semana
ónix a 8 de Agosto de 2010 às 00:36

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