Enquanto oiço a banda sonora original de Rodrigo Leão para a série televisiva «Portugal, um retrato social», termino esta brevíssima digressão pela poesia do livro de António Ramos Rosa, intitulado «Pátria Soberana seguido de Nova Ficção», com mais um dos poemas nele insertos.
Claro está que o melhor é ler mesmo todo o livro.
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O homem que perdeu o sentido da terra perdeu tudo
Não pode o escultor dar forma ao que não tem matéria
Todos os nossos gestos correspondem à paisagem e se não
perde-se a relação viva a consonância essencial
Senta-se alguém sobre uma pedra entre pinheiros
e tem em frente o mar e corre leve a brisa
Poderá estar cansado mas a paisagem limpa-lhe
a mente e aligeira as suas sombras
Quem olha ainda a linha imóvel das montanhas
e vê no mar a indolente ondulação de uma pantera
e vê as estrelas como se um leque se tivesse aberto
na cúpula celeste e o universo fosse uma árvore de astros?
A imaginação precisa da matéria prima
das substâncias da terra da visão material
e se queremos sentir que a pátria ainda está viva
temos de construir com a pedra a água o fogo o ar
a habitação aberta ao jogo do universo