(É preciso destramar a crise!)
Já o disse aqui: estamos a viver uma crise política séria, a qual resulta da crise económica que atravessa o país e também o mundo. A primeira é consequência directa da segunda.
Tal crise não surgiu agora – como um relâmpago em céu azul. Vem detrás, de há anos atrás, sendo inevitável ter chegado ao ponto onde chegou hoje. Mas avancemos, olhando para já os meses mais recentes.
O que se está a verificar em Portugal é que ninguém tem resposta assertiva para a crise actual. E é por isso mesmo que estamos a assistir, hora a hora, ao destrambelho político que todos os dias nos entra pela porta dentro, perante uma relativa apatia conformada da massa dos cidadãos deste país. E quando digo ninguém é ninguém mesmo.
Em bom rigor era exactamente este o problema que estava em jogo nos actos eleitorais realizados no ano passado (Parlamento Europeu, Legislativas e Autárquicas). Mas nenhum partido político assumiu tal por inteiro e de forma consequente.
Para ter uma resposta cabal à presente crise é preciso desde logo saber que crise é esta e os porquês dela. E é preciso saber quais as diversas formas de a ultrapassar.
Ora, no meu ponto de vista, sabendo que estas crises do capitalismo são cíclicas e inelutáveis, sucede que esta crise é a mais grave registada até agora. A chamada «globalização» imprimiu às crises cíclicas do sistema uma dimensão generalizada e avassaladora (daí o resultado, tipo «efeito dominó», a que estamos a assistir) que não encontra precedente histórico conhecido. Mas as suas origens são as mesmas das anteriores. Quer dizer: a apropriação do trabalho e dos lucros gerados por ele é açambarcada por uma minoria; o lucro implica a descoberta de novas rentabilizações dele mesmo, sob pena dele estiolar e morrer. A competição torna-se frenética e letal entre os monopólios capitalistas. Enquanto isto, a esmagadora maioria da população que produz a riqueza fica crescentemente coarctada do acesso a ela e mesmo do acesso aos próprios bens que produziu. O “progresso” transforma-se no seu contrário. Isto obriga o capital a uma destruição brutal e dramática das forças produtivas existentes (fecho de fábricas e empresas, aglutinação de outras, despedimentos em massa, trabalho precário). Até que se gere, através e após esta violência, uma nova situação de equilíbrio no chamado «mercado». Um equilíbrio onde chega possível voltar a escoar (vender) os produtos e bens produzidos em excesso pela anarquia de produção que caracteriza o sistema capitalista. Um equilíbrio, é claro, que mais adiante será novamente quebrado por nova e mais séria crise…
Resulta daqui, parece-me óbvio, que a solução real para a crise não passa pelos caminhos e receitas do costume. A receita do 25 de Abril, resultou? A receita das «nacionalizações» (burguesas), resultou? A receita dos acordos com o FMI, resultou? A receita da «Europa Connosco», resultou? A receita da «moeda única» resultou? Não. Tudo isso foram coisas que não passaram de aspirinas, de paliativos – e que, aliás, muitas delas o povo trabalhador pagou com língua de palmo (e continua a pagar). Esta reflexão não foi feita e, por isso, não se tiraram conclusões quanto ao modo de vencer a crise - a qual, não duvidem, vai continuar a agravar-se.
Nestes termos é preciso dizer que não há solução sem derrube do capitalismo. É brutal? É. Mas é assim mesmo. Se os meus caros amigos têm dúvidas a este respeito, então preparem-se para o que aí vem nas próximas semanas ou escassos meses e depois não se queixem, como por vezes nos é típico. É preciso tomar o poder de Estado e organizar a produção e a sociedade de modos radicalmente diferentes dos actuais. Acreditem que isto não vai com paninhos quentes.
As forças políticas que temos encobrem este problema; ou mistificam-no; ou não lhe dão o destaque merecido. Foi também por isso que as últimas eleições nada resolveram; agravaram mesmo a situação. Afinal, vivemos a maior crise capitalista que o mundo conheceu nos últimos 70 anos e nenhum partido se apresentou ao eleitorado com uma política clara para sair e vencer esta crise de acordo com a classe que cada um deles defende...
De tal forma que a presente situação é de verdadeiro pântano político. Mas também é certo que para o ultrapassar e para ultrapassar de vez o capitalismo precisamos de uma coisa prévia: ideologia.
Ora aqui está uma coisa que atemoriza e põe os cabelos em pé a muita gente, quer à direita quer à esquerda (termos, aliás, que parecem ter perdido já, convenhamos, todo o seu sentido original). Ideologia? Sim!
As insuficiências ideológicas das forças que verdadeiramente podem transformar o actual estado de coisas são grandes. Mas é por isso mesmo que importa tomar posição correcta sobre tudo aquilo que possa elucidar o povo em geral sobre a falência deste sistema. Ou, ditas as coisas de outra maneira: não vale a pena os partidos copiarem-se uns aos outros; o que vale e interessa é cada partido assumir-se como porta-voz dos interesses políticos e de classe que representa (uma vez que os partidos existem porque existem classes e camadas de classe que reclamam uma representação política na vida política do país).
E outra coisa é necessária: preservar e divulgar a ideologia que importa, mas sabendo-a levar ao seio da maioria – o que só se pode fazer estando com essa maioria ombro com ombro a cada momento, em cada luta que estala.
Por mim, eu sei o lado da barricada em quero estar e faço por estar: o lado dos que vivem exclusivamente do seu trabalho.
Apelo a que pensemos nisto. Será uma forma de destramar a crise. E de encontrar o caminho que urge seguir. Um caminho, direi eu, que só pode ser percorrido se rompermos com preconceitos, maus hábitos e velhos clichés.
Para já fico por aqui. E vós continuai - atentos - por aí.
