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Eis mais dois poemas encontrados no meu velho computador não portátil, no qual há tanto tempo não mexia (ver post de 1 de Dezembro).
O primeiro tem data e tenho quase a certeza que foi publicado algures, por aí - não lembro onde e em que momento.
O segundo, é por certo uns anos mais antigo; já levou tantas voltas e reviravoltas que lhe perdi a data original. Acontece. Fica aqui agora, na forma que julgo ser a definitiva.
E vocês, continuem por aí.
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I
Quando as mãos não têm onde pousar
os dedos onde penetrar
e as mãos tremem
limitam-se a tremer e a mostrar-se inúteis
imagino que os olhos choram
as costas se curvam
os ombros desfalecem até ao outro dia
até ao meio-dia do outro dia
II
É preciso encontrar um lugar terno e afoito para as mãos
um lugar de origem
uma espécie de lugar eterno a existir
Claro
morremos para sempre
Mas de gostar-se ou não da vida
depende muita morte e o olhar
com que a fitamos regularmente
Acontece gostar-se
e gosta-se do modo
como por dentro dos olhos o vermelho cresce
III
As coisas acontecem pelo olhar
É um modo como qualquer outro
embora menos desprendido
É claro que morremos
e esquecemos
depressa ou devagar esquecemos
Porém como as mãos
olhar é coisa partilhável e que fica
como um modo expedito de estremecer a vida
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SEM TÍTULO(s)
Havia tudo na claridade do seu rosto
Os que a dor levou…
Os que não conseguem dormir…
Os que têm as mãos feridas de si…
Os que nascem famintos e assim morrem…
Os que sobrevivem remoendo…
Os que têm as lágrimas todas nos ombros…
Os que gritam com as unhas na carne…
Os que não aceitam o mundo…
Os que não têm voz plena…
Os que têm a verdade sob a língua…
Os que dedilham os lábios com urtigas…
Os que venceram queimando a boca…
Aqueles que caiem de borco no silêncio…
Havia...
Já não há?
(Cruz-Quebrada, 28.11 - 06.12.2004)