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Jul 13

 

 

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TEMPO SUJO


Há dias que eu odeio

Como insultos a que não posso responder

Sem o perigo duma cruel intimidade

Com a mão que lança o pus

Que trabalha ao serviço da infecção


São dias que nunca deviam ter saído

Do mau tempo fixo

Que nos desafia da parede

Dias que nos insultam que nos lançam

As pedras do medo os vidros da mentira

As pequenas moedas da humilhação


Dias ou janelas sobre o charco

Que se espelha no céu

Dias do dia-a-dia

Comboios que trazem o sono a resmungar para o trabalho

O sono centenário

Mal vestido mal alimentado

Para o trabalho

A martelada na cabeça

A pequena morte maliciosa

Que na espiral das sirenes

Se esconde e assobia


Dias que passei no esgoto dos sonhos

Onde o sórdido dá as mãos ao sublime

Onde vi o necessário onde aprendi

Que só entre os homens e por eles

Vale a pena sonhar.



                              Alexandre O'Neill (1924-1986)

 

(do livro «No Reino da Dinamarca» - 1958 - extraído da reedição feita pela editora Relógio D'Água, em Setembro de 1997)


publicado por flordocardo às 23:59
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