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Hoje, mais de 40 por cento das exportações alemãs têm por destino os países da zona euro. Continuando, como se sabe, a centrar a sua estratégia económica no forte aumento das exportações, a burguesia alemã só pode, assim, desejar uma coisa: que os seus parceiros da UE continuem a aumentar os seus défices comerciais… Ora são exactamente os défices comerciais - e não os défices orçamentais do Estado - que, gerando uma crescente dívida externa nos países menos desenvolvidos, colocam em risco a solvabilidade de um país e o põem à mercê dos especuladores financeiros (agora designados por “mercados”).
Perante esta realidade não deixa de ser significativo que a senhora Angela Merkel, acompanhada pelo senhor Sarkozy, queira impor mais duras sanções, económicas e políticas (como a perda do direito de voto nas instituições da UE) aos países cujos défices orçamentais excedam os 3 por cento do PIB. E, já agora e a este propósito, em que lado da barricada estavam a Alemanha da senhora Merkel e a França do senhor Sarkozy quando aqui há uns anitos os tais 3 por cento foram ultrapassados, sem que tais países tenham sofrido qualquer sanção?...
A lógica que se está a seguir para “debelar a crise” e “acalmar os mercados” parece-me, de forma simplificada, ser esta: o Banco Central Europeu (BCE) empresta dinheiro aos bancos de cada país a baixo juro (1 por cento) para que estes continuem a poder “financiar a economia”; estes bancos por sua vez emprestam dinheiro a taxas de juro 5 e 6 vezes superiores à praticada pelo BCE e continuam a usufruir de uma taxa de IRC rídicula; os investidores capitalistas, entretanto, continuam a não investir no aparelho produtivo, despedem e comprimem salários; em consequência os países mais pobres, como o nosso, continuam por seu turno a pedir dinheiro emprestado a juros altíssimos, sendo que uma parte substancial desse dinheiro se destina precisamente a pagar as importações feitas à Alemanha, França e outros países…
Os governos, por sua vez (ajudados por vários “especialistas”), cumprem o seu papel: convencer os governados que o “interesse nacional”, os “superiores interesses do país”, a preservação da “independência nacional” (imagine-se!...) passa, sem alternativa, por aceitar a mais selvagem política de austeridade que se possa conceber. E assim se fecha o círculo. Fecha-se é uma forma de dizer, pois quando a estagnação económica der lugar à recessão novos sacrifícios virão a ser pedidos ao povo trabalhador para “tirar a economia da recessão”, com vista a nos colocarmos “a par dos mais ricos” o mais rapidamente possível…
O essencial desta lógica, desta estratégia, assenta precisamente na urgência desesperada de convencer o cidadão e a cidadã comum de que não têm outra hipótese que não seja ceder a todo este estratagema de salvação do Capital. Sem este pressuposto, nada feito.
Ora se isto não é imperialismo puro e duro (ainda que a questão não se esgote aqui) então o que é?
Sucede porém que o nosso verdadeiro problema é salvar o Trabalho e não o Capital em crise.
Por isso Lenine, em 1916 (na obra «O Imperialismo - estádio supremo do capitalismo»), colocava esta questão:
«O essencial da crítica do imperialismo consiste em saber se é possível modificar por meio de reformas as bases do imperialismo, se há que seguir para diante, agudizando e aprofundando ainda mais as contradições que o imperialismo gera, ou se há que retroceder, atenuando essas contradições.»
Ora se queremos salvar o Trabalho, a opção é não retroceder. A opção é encarar o problema de frente e desmistificar a demagogia que por aí vai a este respeito. E afirmar claramente que há alternativa e que isto não vai lá com meras reformas.