* *
Transcrevo na íntegra um artigo de opinião que pilhei do «Diário Económico» on-line. Leiam com atenção e comentem, pois acho que a coisa o merece. E, por agora, limito-me a destacar a vermelho a parte do artigo que considero mais interessante.
*
DE - 23/12/10 - 00:01 - Joseph Stiglitz
«Alternativas à austeridade
No rescaldo da Grande Recessão, os países ficaram com défices sem precedentes em tempo de paz e aumentou a sua ansiedade quanto à dívida que não parava de aumentar.
Esta situação levou à adopção de novas medidas de austeridade em muitos países - políticas cujo resultado acaba por ser, quase sempre, economias nacionais e globais mais fracas a que se junta ainda um nítido abrandamento do ritmo da recuperação. Grandes reduções do défice têm como resultado um abrandamento económico, uma redução das receitas dos impostos e um aumento do recurso ao fundo de desemprego e a outros benefícios sociais.
Mas esta tentativa de travar o aumento da dívida exige ponderação, devendo os países centrar-se nas suas prioridades e procederem a uma reavaliação dos seus valores Os EUA, ao contrário do Reino Unido, não vão proceder a grandes reduções orçamentais a curto prazo. Mas as perspectivas a longo prazo não são muito auspiciosas, sendo necessário fazer alguma coisa, o que levaria o Presidente Obama a nomear uma comissão bipartida de redução do défice que está agora a analisar a situação.
Do ponto de vista técnico, reduzir o défice é muito simples: ou se corta na despesa ou se aumentam os impostos. Mas a agenda de redução do défice, pelo menos nos EUA, vai mais longe: trata-se de uma tentativa de reduzir a protecção social, a progressividade fiscal e o papel e a dimensão do Estado - deixando ao mesmo tempo interesses estabelecidos, como o complexo militar-industrial, praticamente intocáveis.
Nos EUA (e em alguns países industriais avançados) essa agenda de redução do défice tem que ser adoptada tendo em conta o que aconteceu na década anterior: aumento da despesa com defesa, aumento das desigualdades e enfraquecimento da classe média, fraco investimento no sector público, nomeadamente em infra-estruturas e aumento dos apoios às empresas.
Perante isto, é relativamente fácil formular um pacote de redução do défice que aumente a eficiência, fomente o crescimento e reduza as desigualdades. Para tal são necessários cinco ingredientes: aposta em investimentos públicos de elevada rentabilidade, redução das despesas militares, redução dos apoios às grandes empresas, criação de um sistema fiscal mais justo e mais eficiente e, por fim, e uma vez que 20% do rendimento está na mão de 1% da população, um pequeno aumento de 5% nos impostos, o que permitiria arrecadar mais de mil biliões ao longo da década.
Um pacote de redução do défice de acordo com as linhas aqui traçadas corresponderia assim às exigências dos adeptos da redução do défice. Aumentaria a eficiência, promoveria o crescimento e beneficiaria os trabalhadores e a classe média.
Só há um problema. Não beneficiaria os que estão no topo, as grandes empresas e outros grupos de interesse que têm dominado até aqui a política norte-americana, razão pela qual uma proposta razoável como esta nunca será adoptada.»
Tradução de Carlos Tomé Sousa
____
Joseph E. Stiglitz, Prémio Nobel da Economia