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MARIA FÁCIL
I
A que se deu sem sonhos e sem boda
não há proposta a que não diga sim.
Poisar a mão na sua é tê-la toda.
Conhece encruzilhadas, calaboiços,
mas quebra os olhos mudos num jardim,
faz festas aos meninos pequeninos
que brincam nos baloiços.
II
Tem uma cruz de buxo à cabeceira.
Tem o retrato da mãe.
Tem um livrete negro na carteira.
Nada mais tem.
Maria Fácil, chamam-lhe na rua…
É o «enguiço» da prostituição.
Todos a viram nua,
que, para a verem nua,
paga contribuição.
Quando morrer, dirão na viela:
- "Lá vai Maria Fácil, o «enguiço»…
Que bom caixão para o corpinho dela…"
E não se fala mais nisso
Sidónio Muralha (1920 - 1982)
(do livro «Beco» - 1941)