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Dez 12

 

 

*   *   *

 

 O OSSO CÔNCAVO

 

Ó ímpeto do Espírito,

radícula que o vento despenteia e o músculo imprime

travejado por dentro!

 

Ó longilínea dilatação do tempo,

barca oblonga onde nascem os rios, lentos,

adornando seu plasma na noite!

 

Da tua anca de água negra, das cavernas

soltas  no dorso do abismo,

é que te escarvo, osso côncavo,

a fauce rilhando de te lancetar a carne inútil,

o gume da estraçalhada língua, o sibilante enigma,

a curva suspensa e a sombra eléctrica,

ó força, ó inominado!

 

E de te ver!

 

Nem linha elíptica, tu a combinatória do que persiste

no desvão das palavras, quando ingénuas convocam

a eternidade, e nem trave rectilínea ou frontispício,

ou ensanguentada testa de fauno,

tu que só aceitas o esterno e o ilíaco

e a lava que se derrama dos pulmões furiosos;

 

E concebeste o indizível! Como dizer o que há no vazio

em riste dessa curvatura, oscilante eco sem memória

de ventre onde nem a águia se atreve ao vôo

e a serpente se desenrola até à evaginação de si?

              

Não te nomeio. Caminho. E o plano se inclina, grave,

ondulantemente terrível. Névoa ou pele ou pano,

já às raízes se contraem e pulsam, odoríferas, húmidas,

um enxamear de deuses espargindo a poeira;

 

E tu, intacto, flutuante onde ninguém te disse

e a palavra se acoita, espasmódica,

fetal. Seu silêncio enformando-o, ao osso,

côncavo.

 

                  Luís Carlos Patraquim (n. Moçambique, 1953)

 

(do livro «Osso Côncavo e Outros Poemas» - Editorial Caminho, 2005)

 

publicado por flordocardo às 01:11
tags:

É estranho mas entranha-se (não conhecia este autor).
Abraço!
ramsés a 17 de Dezembro de 2012 às 21:22

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